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7/05/19 às 19h01 - Atualizado em 6/10/22 às 18h57

Escolas públicas debatem sobre feminicídio

Aldenora Moraes, Ascom/SEEDF

 

Artista plástica grafiteira Camila Siren. Foto: Mary Leal, Ascom/SEEDF

Há pouco mais de um ano, a estudante de 25 anos Jéssyka Laynara da Silva foi morta pelo ex-militar com quem manteve um relacionamento. No dia da tragédia, o professor de educação física, Pedro Henrique Torres, foi surpreendido em seu local de trabalho, pelo mesmo agressor, que disparou três tiros em sua direção. “Sobrevivi à tentativa de homicídio, mas milhares de mulheres como a Jéssyka não tiveram a oportunidade de continuar a viver. É preciso uma mudança na sociedade, não se pode mais tolerar esse tipo de violência”, afirmou o professor.

 

O caso Jéssyka Laynara foi um dos 29 feminicídios cometidos no ano de 2018. Neste ano, já foram dez. Para Janaína Andréa Almeida, chefe da Assessoria Especial do Gabinete da SEEDF, “o aumento dos casos de feminicídio no DF tem nos causado muito espanto e estranheza. Por isso a escolha desse tema aliada à proposta central da Semana de Educação para a Vida, que é trabalhar o protagonismo estudantil”, explicou.

 

As ações são promovidas em todas as escolas da rede pública. É preciso lembrar que a rede distrital de educação conta com 74% de mulheres. “A escola tem uma função social e uma responsabilidade enorme quanto à violência contra a mulher e não pode ser um local dissociado da realidade, porque formamos o cidadão para o mundo”, enfatizou Janaína.

Deus me fez assim, dona de mim

Para discutir o assunto, o Centro Educacional 619 de Samambaia tem desenvolvido uma série de ações, como o projeto conduzido pela professora de sociologia, Larissa Vasconcelos. “Por meio de uma notícia de jornal, abordamos os direitos humanos e a Lei Maria da Penha, que, inclusive, são contemplados pelo Programa de Avaliação Seriada (PAS). A partir dessa ação, os estudantes passaram a desenvolver argumentos com embasamento legal em defesa da mulher, não se restringindo ao senso comum”, comemorou Larissa.

 

Coral Evolução. Foto: Mary Leal, Ascom/SEEDF

Dando continuidade às ações, a unidade escolar recebeu para uma roda de conversa, nesta manhã, 7/5, a editora-executiva do portal de notícias do Metrópoles, Priscilla Borges, a juíza do TJDFT Fabriziane Zapata, e a Conselheira dos Direitos da Mulher do DF Lúcia Bessa.

 

O evento contou, inicialmente, com a apresentação do grupo musical Conexão e do Coral Evolução, que cantou e encenou o ciclo de violência vivenciado por diversas vítimas, além de proferir versos empoderados da canção Dona de mim, da cantora Iza. Enquanto as apresentações ocorriam no auditório, um grupo de grafiteiras, lideradas pela artista Siren, pintava um enorme grafite no muro principal da escola. “É uma forma lúdica de colocar as meninas como protagonistas. Elas são as donas da história”, definiu.

 

Durante a roda de conversa, Priscilla apresentou o projeto Elas por Elas, do Metrópoles, que monitora os casos de feminicídio ocorridos no DF e divulga matérias especiais no veículo. A editora ressaltou o papel da mídia no enfrentamento da violência contra as mulheres.

 

Jornalista Priscila Borges, juíza de direito Fabriziane Zapata, e presidente da Comissão da Mulher Advogada da Seccional da OAB Taguatinga, Lúcia Bessa. Foto: Mary Leal, Ascom/SEEDF

De acordo com a juíza Fabriziane Zapata, o Brasil ocupa o 5º lugar, como país que mais mata mulheres. “Trabalhar questões de igualdade, sororidade e atuar na educação, muda a percepção do que é a violência contra a mulher”, alertou a juíza.

 

Fabriziane criticou os motivos que levam alguns homens a culparem os transtornos mentais por serem violentos com as mulheres. “Se comprovado, o agressor é internado e recebe tratamento psiquiátrico, mas não se pode usar o transtorno mental como desculpa para retirar a responsabilidade do homem que agride”, defendeu.

Masculinidades

As participantes foram unânimes em ressaltar que os homens precisam participar do enfrentamento à violência contra a mulher. “Os conflitos vivenciados nos lares chegam à escola. Por isso, ações como essa são imprescindíveis para mudar a realidade”, elogiou o coordenador da Regional de Samambaia, Cícero Elivan. Recentemente, ele se deparou com um estudante, que retornava do Rio de Janeiro, onde a mãe foi assassinada com 40 facadas pelo companheiro.

 

Coordenador da Regional de Ensino de Samambaia, Cícero Elivan, fala aos participantes da programação da Semana para a Vida. Foto: Mary Leal, Ascom/SEEDF

Segundo  Elias Júnior Batista, do 2º ano, “rodas de conversa contribuem para mudar a consciência dos homens e a educação é fundamental. Na verdade, é o básico de tudo”, defendeu. A postura de Batista é corroborada por pesquisadores do tema, que insistem na necessidade de se discutir a masculinidade hegemônica, que é orientada pela violência e pela posse.

 

De acordo com Lucas Amaral, professor do Centro Universitário UniCEUB e coordenador do projeto de pesquisa Interfaces: ciências sociais, psicologia e direitos humanos ,“o feminicídio é um crime que ocorre pelo fato de uma pessoa ser mulher. É um fenômeno grave decorrente de vários fatores. Há indicadores, por exemplo, de que uma mulher negra tem três vezes mais chances de ser morta do que uma mulher branca, bem como o fato de que relações passionais são uma das causas de tais crimes”, elucidou.

Em briga de marido e mulher

O encerramento da ação contou com a presença da cantora de hip-hop, Débora Glamourosa, cujos versos denunciaram a violência sofrida. Antes, Lúcia Bessa havia relatado sua própria experiência.

 

“Das ruas empoeiradas de Ceilândia, um professor me resgatou, porque viu em mim algum potencial”, emocionou-se. Estudante da rede pública de ensino, a jovem convivia com a violência e a reproduzia. “Meu pai utilizava uma foice para ameaçar nossa família. Nós saíamos buscando ajuda na vizinhança, mas, naquela época, em briga de marido e mulher, ninguém metia colher”, lamentou.

 

As lembranças, entretanto, não a desanimaram. Hoje, conselheira dos direitos da mulher do DF, Lúcia difunde sua mensagem de superação e esperança: “Se eu consegui, vocês também conseguem. Não sou melhor do que vocês, somos agentes transformadores da nossa existência. Mesmo crescendo em meio a tanta violência, a mudança é possível”, declarou, sendo aplaudida pelos estudantes.

 

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